Conjur
15 de agosto de 2010
A Emenda Constitucional 45, conhecida também como Reforma do Judiciário e editada em 2004, não deu conta de sanar um problema enfrentado pelos tribunais superiores: a grande demanda de agravos impetrados. O Projeto de Lei da Câmara 192/2009 pretende preencher essa lacuna, modernizando os procedimentos referentes ao Agravo de Instrumento. Aprovado no último dia 4 de agosto pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, a proposta segue agora para a Câmara Federal, onde aguardará a decisão final.
Concebido pelo deputado federal Paes Landim (PTB-PI), o PL “transforma o Agravo de Instrumento interposto contra decisão que não admite o Recurso Extraordinário ou Especial em agravo nos próprios autos, alterando dispositivos da Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973”. Em outras palavras, os instrumentos anteriormente requisitados para compor o documento, como cópias da decisão agravada e certidões de intimação, deixam de ser necessários. E o agravo, que hoje tramita de maneira separada da ação principal, passará a correr juntamente aos autos.
O Código de Processo Civil prevê a possibilidade de pedido de agravo no artigo 496, inciso II. Os artigos 524, 525, 526 e 527 tratam especificamente do Agravo de Instrumento, que pode ser interposto em duas ocasiões. Primeiro, quando a decisão não admite mais o Recurso Extraordinário, no caso do Supremo Tribunal Federal. Ou, então, quando a decisão não aceita Recurso Especial, no caso do Superior Tribunal de Justiça. Só este ano, o STF recebeu 26,8 mil agravos.
O senador Pedro Simon (PMDB-RS) argumenta, no parecer do processo aprovado pelo Senado, que o agravo se tornou uma “anomalia jurídica”. A concepção inicial consistia em utilizá-lo como uma exceção aos demais recursos que viessem a ser inadmitidos nos tribunais. Porém, hoje é visto como um recurso usual para provocar a subida dos recursos. O resultado é a maior demora na prestação jurisdicional. Não bastasse o encaminhamento dos autos ao STJ ou ao STF, há ainda uma espera aproximada de seis meses na tramitação.
A proposta determina que a interposição do agravo nos próprios autos deverá ocorrer em até dez dias. O mesmo período é previsto para o agravado ser intimado a responder. Daí, existem três possibilidades, no caso de o pedido ser acatado pelo ministro relator: a decisão que não admitiu o recurso pode ser mantida, o recurso pode ser arquivado, no caso de conflitar com súmula ou jurisprudência previamente existente ou, ainda, o agravo pode receber provimento.
Para Marcelo Vieira de Campos, secretário de Reforma do Judiciário, a mudança é benéfica principalmente em três pontos: colabora com a celeridade processual, diminui o custo e o tempo de tramitação e economiza espaço físico destinado à armazenagem dos autos. “Ganha também o jurisdicionado. Ele tem seu agravo analisado mais rapidamente. Caso seja acatado, logo será convertido em Recurso Especial”, acredita.
A aprovação da medida vem na esteira de outras que buscam, tal qual, conferir mais celeridade aos tramites processuais. Na última semana, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu adotar o sistema de votação em listas no julgamento dos Agravos Regimentais. Nas palavras do ministro Ricardo Lewandowski, a decisão teve como norte vencer o “acervo fenomenal”. Atualmente, 5 mil desses agravos descansam sobre as mesas dos gabinetes dos cinco ministros da turma esperando por uma decisão. O Agravo Regimental é cabível quando o de Instrumento já foi negado monocraticamente. O ministro Marco Aurélio foi contra a medida.
O sistema de listas no julgamento dos Agravos de Instrumento foi proposto pelo próprio ministro Lewandowski. Não há segredo. Matérias idênticas de agravos são reunidas em uma lista detalhada. Além de ser encaminhada aos ministros, ela será exposta no quadro de avisos na entrada da sala de sessões. Assim, as decisões acontecem em bloco, tornando o processo mais rápido. O procedimento não é inédito. “Em muitos tribunais superiores o sistema de votação em listas é usual”, informa o secretário da Reforma do Judiciário. É o que acontece no Tribunal Superior Eleitoral e também na 2ª Turma do STF.
De acordo com Christiane Rodrigues Pantoja, sócia do setor contencioso do Siqueira Castro Advogados, as listas não violam o contraditório e a ampla defesa. “Há preocupação com todos os princípios constitucionais”, acredita. Ela também considera que o sistema, por ser mais rápido, traz benefícios ao jurisdicionado. “O Agravo Regimental é praticamente um dos únicos recursos cabíveis. Às vezes a pessoa já esperou por muito tempo por uma solução. Assim, a agilidade é bem-vinda”, expõe.
O julgamento em listas não permite defesa oral do advogado. Ainda assim, ele pode pedir destaque se considerar que a matéria possui peculiaridades que não sejam abarcadas pelos outros agravos. Caso opte por esse caminho, o julgamento acontece separadamente.
O secretário-geral do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Marcus Vinicius Furtado Coelho, acredita que qualquer alteração do Código do Processo Civil deve ser discutida no bojo das alterações da própria Reforma do Judiciário em conjunto. Para ele, é natural que os cidadãos queiram recorrer. “A Constituição Federal assegura o direito ao recurso. Claro que é necessário impedir a litigância de má-fé, no caso em que o recurso seja utilizado com o fim de protelar o processo”, explica. Segundo Furtado Coelho, o Conselho ainda não possui nenhum posicionamento acerca da PL.
E é sobre essa protelação que o II Pacto Republicano de Estado por um Sistema de Justiça mais Acessível, Ágil e Efetivo, assinado em abril de 2009, também trata. Assinado pelo presidente da República, pelo Senado, pela Câmara e pelo Supremo Tribunal Federal, um dos pontos do documento ressalta o tratamento a ser dado para os agravos: “Revisão de normas processuais, visando a agilizar e a simplificar o processamento e julgamento das ações, coibir os atos protelatórios, restringir as hipóteses de reexame necessário e reduzir recursos”.
No parecer do Senado, Pedro Simon ainda argumenta que a interposição do Agravo de Instrumento leva o STJ e o STF a examinar uma mesma demanda em dois momentos distintos. “Primeiro, para avaliar se foi acertada a decisão de abortar, ainda na origem, o Recurso Especial; depois, concluindo pelo desacerto de tal decisão, para julgar o mérito da questão controvertida.”
É da mesma opinião a advogada Christiane Pantoja. Para ela, muitos esforços são dedicados e muito dinheiro é gasto nesse tipo de julgamento. “A morosidade e a onerosidade resultam em processos estancados. Isso aumenta o Risco Brasil, aumenta as taxas de juros. É ruim para o país”, argumenta.
Além do recurso de julgamento em blocos dos Agravos Regimentais, os Tribunais Superiores lançam mão de outros artifícios, como explica a advogada. Bons exemplos são as súmulas de efeito vinculante, a Lei dos Recursos Repetitivos do STJ e a Lei da Repercussão Geral do STF. Essa última prega a análise do recurso apenas nos casos em que seja comprovado o interesse público da matéria. Assim, um tema que não tenha repercussão, seja ela econômica, jurídica ou social, apenas para citar algumas, não tem vez. “Do mesmo modo”, explica a advogada, “as listas são um serviço favorável à celeridade dos julgamentos”.
Por Marília Scriboni
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